A história e a receita do sucesso da Confeitaria Colombo

Por CJ Dunlop

A gravura, reprodução de um desenho de Henrique Cavalleiro, do comêço do século, mostra o antigo prédio ns. 34/36 da rua Gonçalves Dias, constituído de loja e sobrado.
A gravura, desenhada por Henrique Cavalleiro, mostra o antigo prédio 34/36 da rua Gonçalves Dias, no Centro do Rio.

 

Foi numa segunda-feira, dia 17 de setembro de 1894, que se inaugurou, na rua Gonçalves Dias, o estabelecimento comercial que viria a se transformar no “resumo da história intelectual e galante da cidade" – a Confeitaria Colombo. Fundaram-na dois lusitanos: Manoel José Lebrão e Joaquim Borges de Meireles.

Segundo Leôncio Corrêa, a fundação da Colombo pareceu providencial. Nela foi estabelecido o terreno neutro, onde os corações desavindos se reconciliavam e fraternizavam. Valeu pelo desabrochar do primeiro sorriso, largo e sereno, do Rio de Janeiro, após luta tremenda da Revolta da Armada, que abrira chagas nas almas e nos corações, ao que parecia, de difícil cicatrização.

Conquanto fosse bem arranjado, não logrou o estabelecimento, desde logo, desbancar as suas congêneres, principalmente a Confeitaria Pascoal, que continuou por muitos anos em pleno fastígio, como “ponto de reunião do mundo elegante, dos paredros da terra, dos grandalhões da literatura, do alto comércio e das finanças”.

No fim do século, porém, dois fatos coincidentes fizeram deslocar para a rua Gonçalves Dias o cenáculo literário que vivia na rua do Ouvidor: o primeiro foi quando, em 1898, passando Meireles a sócio comanditário, ficou Lebrão à testa da firma. Espírito progressista, tratou de mudar a refinação de açúcar e a fábrica de doces para outro local. Em seguida, reformou as instalações, transformando o estabelecimento num grande e luxuoso bar-confeitaria.

O outro fato é que, quase ao mesmo tempo, deu-se uma desinteligência entre Olavo Bilac (Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac) e o gerente da Pascoal, culminando na mudança do excelso poeta para a Colombo, com toda a sua roda de amigos.

A gravura acima é reprodução de um desenho de Henrique Cavalleiro, do começo do século. Mostra o antigo prédio números 34/36 da rua Gonçalves Dias, constituído de loja e sobrado. O salão – conforme descreve Luiz Edmundo – era pequeno. As mesas também. De grande, na casa, só a tabuleta, fora, toda em lona, esticada num painel enorme sôbre um “chassi” de madeira, pesando no gradil da sacada de ferro.

Junto a uma das portas de entrada, bem à vista, havia um empadário de ferro e cristal e, mais para o centro do salão, um outro, ambos aquecidos, ambos a fumegar entre nuvens ligeiras de fumaça, porque empadas, empadões, maravilhas, croquetes e pastéis, bem como toda a gama de petiscos da regional pastelaria, só se compreendiam, no tempo, quando a ferverem, a queimarem...

Cada empadário – é ainda Luiz Edmundo quem conta – mostrava, à porta, o “seu” Cérbero, montando guarda, o olho aritmético em vigia, para que o freguês não abusasse dos erros de soma, lesando a caixa. Cérbero, no entanto, não intervinha na escolha do manjar; olhava sòmente, contava, fiscalizava. Se lhe indagavam, porém:

– Quanto a maravilha de siri?

Respondia:

– Dois tostões.

E, na hora de pagar, quando ouvia o freguês:

– Creio que comi oito pastéis...

Corrigia:

– Comeu nove...

No sobrado do edifício ficavam os dormitórios dos empregados e no prédio contíguo, de número 32, que se comunicava com a Confeitaria, estava localizado o armazém de comestíveis, inaugurado em fins de 1898.

 

 

(C. J. Dunlop, Rio Antigo, vol II, 1956)